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sexta-feira, 5 de março de 2010

Entendendo a Decisão do STF sobre a Inconstitucionalidade do FUNRURAL

por Wanderley Antonio da Silva

 

Em recente (03/02/10) decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiram os Ministros, por unanimidade, pela inconstitucionalidade da cobrança  do FUNRURAL, tributo pago pelos produtores rurais, pessoa físicas e jurídicas,  na ocasião em que comercializam com a indústria. Preocupada em esclarecer seus  clientes, produtores rurais, a empresa Safras & Cifras Ltda submeteu o tema  à apreciação de nosso escritório, solicitando informação completa e acessível, o  que se pretende fazer sinteticamente na sequência.
 
Entenda a  inconstitucionalidade do FUNRURAL.
 
Com relação aos produtores  PESSOA JURíDICA, entenderam os Ministros que o FUNRURAL caracteriza adicional da COFINS, já que incide  sobre a mesma base de cálculo e, como a COFINS possui amparo em lei  complementar, não poderia ser alterada por lei ordinária, sob pena de afronta ao  princípio da legalidade. Também destacaram violação ao princípio da isonomia,  por diferenciar as agroindústrias – que contribuem pela folha de salários desde  o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.103-1/DF – das demais  pessoas jurídicas. Não suficiente, apontaram ainda desrespeito ao princípio da  proporcionalidade (que orienta o legislador a instituir o tributo da forma menos  gravosa), já que a Constituição Federal estabelece a incidência de contribuições para a Previdência sobre a folha de salários, faturamento e o lucro, enquanto  que o legislador sobrecarregou o faturamento, em detrimento das demais fontes de  custeio. 
 
No tocante aos produtores  PESSOA FíSICA, decidiram os Ministros que a cobrança do FUNRURAL, na forma em que vige, somente poderia ocorrer  em relação aos segurados especiais (produtores sem empregados), por se tratar de  exceção constitucional. Sustentaram também a transgressão do princípio da  igualdade, por onerar de forma desigual os empregadores rurais, que contribuem  sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção, dos empregadores urbanos, contribuintes sobre a folha de salários.
 
Ainda, e  finalmente, ressaltaram a carência de lei complementar, mais uma vez implicando  em quebra do princípio da legalidade.
 
Quem é atingido pela  decisão?
 
A decisão repercutiu no  meio rural, causando dúvidas quanto à modificação na rotina dos produtores. O importante é além de compreender  a decisão, adotar as medidas necessárias para atingir o direito reconhecido pelo  STF. Como o processo julgado envolveu somente o Frigorífico Mataboi S/A e o  Mataboi Ltda, cada interessado deverá propor ação individual, solicitando  decisão semelhante na Justiça Federal.
 
E as contribuições pagas no  passado?
 
Os Ministros, após proferirem seus votos, analisaram manifestação do Fisco, na qual pretendia a modulação dos efeitos da decisão, em  outras palavras, que os efeitos da inconstitucionalidade só fossem produzidos a  partir da decisão, ou seja, somente depois do dia três de fevereiro deste ano.  Logicamente que a pretensão visava evitar a devolução dos tributos pagos indevidamente. Depois de manifestarem-se os Ministros, o pedido foi negado por  maioria, vencida a Min. Ellen Gracie. Desta forma, aqueles que pretendem  recuperar as contribuições indevidamente recolhidas, deverão propor ações de  repetição de indébito, observada a prescrição de seus direitos. Daí porque o  tempo urge aos produtores, pois cada dia a mais de espera é um dia a menos de restituição.
 
A relação entre os  fornecedores e a indústria.
 
A confusão provocada pela  decisão é tamanha, que alguns produtores podem reclamar, sem amparo em qualquer  decisão judicial, quando receberem seus pagamentos abatidos da contribuição para  o FUNRURAL. De outro lado, é possível que algumas indústrias deixem de reter e  recolher a contribuição, sem amparo em medida liminar, sujeitando-se ao risco de  pesadas autuações. Vale repetir: a decisão judicial somente atinge o Frigorífico  Mataboi S/A e o Mataboi Ltda. O que se recomenda é a propositura de ação individual, preferencialmente pelo produtor rural, contribuinte de direito,  objetivando deixar de recolher a contribuição, mediante depósito em juízo do  valor devido, até que se torne definitiva a decisão em seu processo  individual.
 
A restituição é da  indústria ou dos produtores?
 
O contribuinte é o  produtor. A indústria tem o dever de reter e recolher a contribuição. Há quem  defenda que a ausência de destaque na nota fiscal do FUNRURAL, autoriza o  industrial a propor a ação de repetição de indébito em seu nome, pois assim não teria repassado o ônus ao produtor. Não tem sido este o entendimento dos  tribunais. O preenchimento da nota não tem força suficiente para alterar a  legislação tributária, conforme recentemente se manifestou o Superior Tribunal  de Justiça (STJ) no recurso especial nº  800.036-SC. (Fabiano de Marco
 
Produtores rurais de todo país já podem se preparar para velar a morte de uma das maiores excrescências de nosso sistema tributário: o FUNRURAL.

Criado na década de 1970 com o intuito louvável de estender ao homem do campo os benefícios previdenciários dos trabalhadores urbanos, o tributo acabou por ser revogado, tacitamente, pela Constituição de 1988 quando da unificação dos sistemas previdenciários rurais e urbanos, universalizando as fontes de custeio e seus beneficiários.
 
Ocorre que o governo, sempre na sanha arrecadadora e perpetrando, na matéria tributária, as maiores irregularidades de nosso direito; acabou por ressuscitar a contribuição do FUNRURAL por meio de manobras legislativas escusas, onerando o produtor, até hoje, com uma alíquota de 2,1% calculados sobre a venda de seus produtos.
 
Um absurdo, uma "maracutaia" legalizada, que leva o homem do campo a custear sua contrapartida para o INSS em valores imensamente maiores e desproporcionais se comparados às contribuições normais feitas sobre a folha de salários.
Apenas para exemplificar, o pecuarista que abate 1.000 bois durante o ano recolhe para os cofres do INSS, a título de FUNRURAL, o equivalente à R$ 26.000,00. Contudo, se fizesse o recolhimento com base na folha de salários, considerando que para o manejo de 1.000 bois ao ano necessitaria, apenas, de dois funcionários com salário médio de R$ 1.000 cada um; recolheria à previdência, neste caso, cerca de R$ 560,00 ao mês (28%) ou R$ 6.720 ao ano. Uma diferença estratosférica, desigual e discriminatória.
 
Mas antes de comemorar, o produtor deve se acautelar para uma possível bomba relógio que vem pela frente. É que os frigoríficos, no caso do FUNRURAL, são classificados como substitutos tributários, ou seja, são eles que cobram do produtor e repassam ao Fisco. Ocorre que alguns frigoríficos, já pensando em se beneficiar, deixaram de especificar a retenção do FUNRURAL nas notas fiscais de compra de gado, apesar de continuarem a descontar o valor da contribuição do produtor. Se os frigoríficos ganharem as ações eventualmente propostas, poderão afirmar que suportaram o encargo financeiro e apresentarão as notas sem a retenção do FUNRURAL, recebendo para si aquilo que foi descontado dos pecuaristas. A maioria dos produtores não terá ciência sobre o desfecho das ações e não reclamará o seu quinhão.
É urgente a situação e os produtores rurais devem procurar seus advogados a fim de se proteger.
Em nosso escritório várias ações individuais já estão sendo ajuizadas com base na decisão da Suprema Corte. Estamos aconselhando os produtores a exigir dos frigoríficos que não apontam o desconto do FUNRURAL na nota fiscal que forneçam uma declaração atestando que o imposto foi cobrado.
Produtor desunido é presa fácil da alcatéia!
 
 
 
Wanderley Antonio
Advogado
Pós graduando em Direito Tributário